De fato, um movimento social, com seu caráter conflituoso e coletivo, mostra uma relação de poder, cujo desenvolvimento implica a mudança ou a conservação de privilégios, valores, normas, regras que condicionam as nossas relações. Temos assim que os movimentos sociais tanto podem provocar mudanças, como também podem ser organizados justamente para resistir às mudanças.
Um exemplo que nos mostra muito bem a resistência ao processo de mudança foi o da União Democrática Ruralista (UDR), formada por proprietários rurais e que desenvolveu uma grande luta, na constituinte de 1988, contra a reforma agrária, em oposição aos que, na oportunidade, lutavam para obter direitos constitucionais que lhes garantissem o acesso à terra para trabalharem.
Esse exemplo nos mostra, além da correlação de força entre os latifundiários e os sem-terra, duas outras questões importantes sobre os movimentos sociais. A primeira é que não existem apenas movimentos de oprimidos; a segunda revela que, dependendo do grau de consciência dos seus participantes, um movimento pode ter caráter preventivo, antecipando-se a uma situação futura, que seria, no caso, a desapropriação de terras pela reforma agrária.
É válido ressaltar que os aspectos políticos dos movimentos sociais também ganham coloridos diversos dependendo da abordagem que se queira realizar.
Os autores que compartilham do paradigma histórico-cultural consideram os movimentos sociais fundamentais para a democratização do Estado – visto por eles como uma instituição de poder por meio da qual se processam as mudanças na estrutura social.
Quanto aos autores do paradigma culturalista, esses afirmam que os movimentos sociais não visam o poder do Estado, mas apenas influenciar no seu sistema de dominação, com vistas a resgatar valores que foram corrompidos pela sociedade capitalista.
E os autores de abordagem autonomista, também conhecidos como não-idealistas (amparados em teorias diversas, entre elas o anarquismo de Proudhon) dizem que os movimentos não estariam voltados para a tomada do poder do Estado e muito menos para influir nesse poder, mas se situariam, ao contrário, fora do âmbito do Estado, voltados para a liberdade de ação, para a não institucionalização, para a construção de novos espaços onde os indivíduos teriam autonomia. O sociólogo alemão TilmanIvers se enquadra nessa perspectiva de análise.
Qualquer que seja a abordagem, qualquer que seja o sentido político do movimento – se voltado para a mudança ou para conservação -, o fato é que, para a sua eclosão e desenvolvimento, não basta a existência de uma situação de opressão. É preciso que as pessoas se percebam como oprimidas (sentimento de opressão), como grupos e classes com interesses comuns; só a partir de tal identidade é que se podem desenvolver ações que venham a constituir-se em movimentos sociais.
Qualquer que seja a forma de opressão, explicitada em qualquer dimensão da vida social, política, religiosa, cultural, etc., ou qualquer que seja sua natureza, se estrutural – decorrente da maneira como a sociedade é estruturada para se reproduzir – ou conjuntural – decorrente de fatores momentâneos ou circunstanciais – , o fato é que, para superar as condições de opressão, é necessário a ação conjunta dos homens, de forma a potencializar sua força – através de um movimento – em direção à mudança ou a conservação das relações de opressão.