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Cidadania no Brasil (Parte 4)

Cidadania no Brasil de José Murilo de Carvalho
Por Jeniffer Modenuti

Parte IV
A cidadania após a redemocratização
A constituinte de 1988 redigiu e aprovou a constituição mais liberal e democrática que o país já teve, merecendo por isso o nome de Constituição Cidadã.Em 1989, houve a primeira eleição direta para presidente da República desde 1960.

Os direitos políticos adquiriram amplitude nunca antes atingida. No entanto, a estabilidade democrática não pode ainda ser considerada fora de perigo.

A democracia política não resolveu os problemas econômicos mais sérios, como a desigualdade e o desemprego. Continuam os problemas da área social, sobretudo na educação, nos serviços de saúde e saneamento, e houve agravamento da situação dos direitos civis no que se refere à segurança individual.

A distorção do nosso arranjo parlamentar é apontada por Carvalho como um sério problema de caráter institucional da política brasileira. Segundo o autor, o desequilíbrio da representação favorece setores mais conservadores da população. Para ele, isso é um vício do federalismo difícil de ser resolvido, já que para as mudanças políticas ocorrerem, elas precisam passar pela aprovação dos próprios deputados que são beneficiários desse sistema.

O surgimento do Movimento dos Sem Terra (MST) passa a representar uma força política ao incorporar uma parcela excluída da população à vida política, e “é o melhor exemplo de um grupo que, utilizando-se do direito de organização, força sua entrada na arena política, contribuindo assim para a democratização do sistema” (CARVALHO, 2002, p.203).

A frustração com o governo da nova república se fez presente com o descontentamento diante políticos, partidos, corpo Legislativo que voltaram a transmitir a imagem de incapazes, corruptos e egoístas. Gerou-se a expectativa de encontrar uma nova liderança, se não, um messias nas eleições de 1989. Nesse ínterim, surge a figura de Fernando Collor, que sabendo usar do apoio da mídia, fez da propagando, a sua vitória nas urnas.

O seu partido, no entanto, não era capaz de dar a ele a sustentação necessária às suas práticas radicais: para acabar com a inflação, reduzir o número de funcionários públicos, vender empresas estatais, abrir a economia ao mercado externo
Passados 8 anos das Diretas Já!, a população vai mais uma vez às ruas contra o governo Collor. O congresso abre o impedimento e dois anos e meio após a posse de Collor, Itamar Franco o substitui.

O impedimento foi, sem dúvida, uma vitória cívica importante. Já que na história do Brasil e da América Latina, revoluções e golpes de Estado foram ferramentas usada para afastar presidentes.

O fato de ele ter sido completado dentro da lei foi um avanço na prática democrática. Deu aos cidadãos a sensação de que podiam exercer algum controle sobre os governantes e a política de seu país.

A Constituição de 1988 ampliou também, mais do que qualquer de suas antecedentes, os direitos sociais. Fixou em um salário mínimo o limite inferior para as aposentadorias e pensões e ordenou o pagamento de pensão de um salário mínimo a todos os deficientes físicos e a todos os maiores de 65 anos, independentemente de terem contribuído para a previdência. Introduziu ainda a licença-paternidade, que dá aos país cinco dias de licença do trabalho por ocasião do nascimento dos filhos. A prática aqui também teve altos e baixos. Indicadores básicos de qualidade de vida passaram por lenta melhoria. (CARVALHO, 2002, p.206).

 

O campo da escolaridade alcançou avanços, mas ainda há empecilhos, como altos índices de repetência e evasão. A aposentadoria também é uma forma de gerar renda e condições de vida mínimas, acompanhando o salário mínimo. Porém ainda estão abaixo do ideal.

As maiores dificuldades na área social têm a ver com a persistência das grandes desigualdades sociais, sobretudo as de natureza racial e regional, que caracterizam o

A concentração de renda, poder e riquezas nas mãos de poucos tem como consequência altos níveis de pobreza e miséria.O crescimento econômico, por si só, não é capaz de resolver os problemas da desigualdade.

Os direitos civis estabelecidos antes do regime militar foram recuperados após 1985. Entre eles: a liberdade de expressão, de imprensa e de organização.

O direito de habeas data, do qual qualquer pessoa pode exigir do governo acesso às informações existentes sobre ela nos registros públicos, mesmo as de caráter confidencial.  O “Mandado de injunção”, ou seja, recorrer à justiça para exigir o cumprimento de dispositivos constitucionais ainda não regulamentados.  O racismo passou a ser punido como crime inafiançável e imprescritível e a tortura como crime inafiançável e não-anistiável.

A Constituição ordenou também que o Estado protegesse o consumidor, que foi regulamentado na Lei de Defesa do Consumidor, de 1990.
Um dos efeitos dessas leis é tornar a justiça mais acessível. “No entanto, pode-se dizer que, dos direitos que compõem a cidadania, no Brasil são ainda os civis que apresentam as maiores deficiências em termos de seu conhecimento, extensão e garantias” (CARVALHO, 2002, p.210).

O fator mais importante no que se refere ao conhecimento dos direitos é a educação.Pesquisas diversas mostraram que boa parte da população não conhece seus direitos.

O intenso crescimento urbano, somado à desigualdade tem intensificado a falta de segurança humana. Essa criminalidade se intensifica, sobretudo, nas favelas e bairros pobres.

A falta de garantia dos direitos civis se verifica sobretudo no que se refere à segurança individual, à integridade física, ao acesso à justiça. O rápido crescimento das cidades transformou o Brasil em país predominantemente urbano em poucos anos. Em 1960, a população rural ainda superava a urbana. Em 2000, 81% da população já era urbana. Junto com a urbanização, surgiram as grandes metrópoles. Nelas, a combinação de desemprego, trabalho informal e tráfico de drogas criou um campo fértil para a proliferação da violência, sobretudo na forma de homicídios dolosos. (CARVALHO, 2002, p.211).
O exército e a política militar ou civil não são suficientemente capacitados ou preparados o suficiente para lidar com os problemas que surgem. Além disso, há muita desconfiança, por parte da população, na figura do policial.


“Do ponto de vista da garantia dos direitos civis, os cidadãos brasileiros podem ser divididos em classes” (CARVALHO, 2002, p.215). O acesso à justiça é injusto, caro e lento. Parte da população não tem conhecimentos sobre os direitos, ou não possui meios de acessa-los. Quando o peso do código penal não recai com mais força sobre eles. Por outro lado, grupos privilegiados tem acesso à justiça de modo diferenciado, favorecendo, muitas vezes, seus próprios interesses.

CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.