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A Formação da Sociologia Brasileira

Por Jeniffer Modenuti
O pensamento social brasileiro, em sua incipiência, foi composto por engenheiros, médicos e advogados, membros das famílias de classe intermediária, mas principalmente abastadas, com grande acúmulo de capital cultural. Eles tinham acesso a universidades dentro e fora do Brasil que propiciaram a eles formações de bacharéis e doutores. Grande parte eram membros da alta aristocracia brasileira, ao contraste que a maior parte da população brasileira vivia na pobreza e no analfabetismo, não possuindo a menor possibilidade de acesso ao conhecimento e à reflexão sobre a sociedade. A exceção a esta regra foi Florestan Fernandes que, por sua vez, teve contato com o manancial de informações que a família para qual sua mãe trabalhava de lavadeira.

Segundo Liedke Filho (2005) até a década de 1920 o pensamento social brasileiro constituía-se à base das discussões elaboradas por diversos pensadores sociais, jornalistas, juristas, médicos, entre outros bacharéis que sofreram as influências europeias e norte-americanas, em particular do Positivismo de Comte, do Organicismo de Herbert Spencer, do Darwinismo Social de  Willian G. Sumner e Lester F. Ward, e mesmo do evolucionismo biológico de Cesare Lombroso. Sob essas influências estes pensadores debruçavam-se sobre duas principais problemáticas: a identidade nacional, colocando como centro a questão racial e da miscigenação, e a formação do Estado nacional Brasileiro, a partir de um projeto de nação, presente principalmente nos embates entre liberais e autoritários. Gilberto Freyre e Sergio Buarque de Holanda bebem desta fonte e realizam seus estudos voltados a aspectos culturais e sociais, discutindo o processo de formação da identidade e da nação brasileira, posicionando-se entre os embates racistas e relativistas contemporâneos a sua produção.

Outro aspecto importante é que esses sociólogos debatem contra a, até então presente, tradição naturalista de pensamento explicativo que buscava a interpretação a partir das causas físicas e naturais para explicar o social. O movimento dos naturalistas partia do ambiente físico para o ambiente social. Por exemplo, Euclides da Cunha em Os sertões, expõe tal modelo explicativo (A terra, O homem, A guerra). O pensamento que prevalecia no início do século XX era que a única possibilidade de se fazer ciência seria a partir das ciências naturais. Manuel Bomfim, Silvio Romero, Sergio Buarque de Holanda representam uma tentativa de desvencilhar-se do naturalismo.

Na década de 1920 que a sociologia passa a se institucionalizar em São Paulo, com a Escola de Sociologia e Política, na formação de professores e posteriormente como curso na Universidade. Avulta-se neste período Fernandode de Azevedo, com influências de Émile Durkheim e Spencer, em a Cultura Brasileira, inicia seu livro a partir da paisagem física e natural, pois ainda é difícil para os sociólogos se desvencilharem facilmente do modelo naturalista. Porém, neste mesmo livro, ele passa a contestar o naturalismo de que faz uso. Torna-se a questionar como construir uma análise de fato sociológica para explicar os problemas sociais brasileiros.

O pensamento naturalista parte de uma base de compreensão que analisa: o meio físico, a raça e então a cultura. A visão que vigorava a respeito do Brasil pensava o povo brasileiro como triste e atrasado. O homem era bruto e apático e o meio era hostil, o que acarreta a um país atrasado em relação aos outro.

Porém com a Sociologia de Cátedra dos anos 1930 novas temáticas vão se desenvolver. Azevedo, muito influenciado pelo pragmatismo de John Dewey, desenvolve suas discussões em torno da democratização e da Escola Nova. Neste período confirma-se uma visão otimista sobre a miscigenação racial. A Sociologia passa a se fazer presente nas Escolas Normais em formar professores.

Com Antonio Cândido e Florestan Fernandes delineia-se uma Sociologia Científica, com um trabalho intelectual e sistematizado dos estudos dos problemas sociais brasileiros. Dentre eles são pensados os contrastes entre sociedade tradicional e modernização, assim como a visão sobre dois brasis, um da elite, do litoral e outro de fato, da maioria pobre, rural e analfabeta da população. A democracia racial entra em julgamento sob o viés das relações raciais e de classes sociais desiguais. Subdesenvolvimento e dependência passam a ser vistos no contraponto da modernização da nação.
Bibliografia:
AZEVEDO, F. A cultura brasileira. Brasilia: UNB, 1998.

CÂNDIDO, A. Fora do texto, dentro da vida. In. Educação pela noite e outros ensaios. São Paulo: Ática, 1989

FREYRE, G. Sobrados e mucambos. Rio de Janeiro: J. Olympio. 1961.
FERNANDES, F. A sociologia no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1986.
FERNANDES, F. A sociologia numa era de revolução social. Rio de Janeiro: Zahar. 1976.
HOLANDA, S.B. Raízes do Brasil. Rio de Janeiro: J. Olympio. 1987.
IANNI, O. Tendências do pensamento brasileiro.Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 12(2): 55-74, novembro de 2000.
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REZENDE, M.J. Democracia em Gilberto Freyre e Sergio Buarque de Holanda. Plura; Sociologia, USP, São Paulo. 3: 14-48. 1 sem 1996.
REZENDE, M.J. Diferenciação, evolução e mudança social em Fernando de Azevedo. Cronos, Natal-RN, v 5/6, n ½, p. 173-192, jan./dez. 2004/2005.